I DOMINGO DA QUARESMA – ANO B = “SE ÉS FILHO DE DEUS…”

Reflexões e ilustrações de Padre Lucas de Paula Almeida, CM

 I Domingo da Quaresma

  A Noroeste de Jericó, há um maciço montanhoso, inculto e áspero, que tem o nome de “Monte da Quarentena” (Djebel­ Garantal). Nesse lugar, segundo a tradição, é que Jesus se retirou para quarenta dias de jejum e oração, logo depois do batismo re­cebido nas águas do rio Jordão. A primeira quaresma do cristianis­mo! E aí, como nos contam os evangelhos, Jesus foi agredido pelo demônio com três violentas tentações. Misteriosas tentações, na verdade, pelas quais o divino Salvador quis ser solidário com nossa condição de frágeis criaturas humanas, sujeitas a todo o tipo de tentações. É claro que Ele jamais poderia ceder a nenhuma tenta­ção; mas quis com seu exemplo ensinar-nos o modo de vencê-Ias. Como disse elegantemente o nosso Padre Vieira, no sermão que pregou em Roma, num.primeiro domingo da Quaresma, na igreja de Santo Antônio dos Portugueses: “Permitiu, pois, Cristo Senhor nosso ser tentado do demônio hoje, não para se honrar com a vi­tória (que era pequeno triunfo), mas para nos ensinar a vencer com seu exemplo”.

O evangelho de Marcos, na sua costumeira concisão, nos diz apenas que Jesus se retirou para o deserto e aí foi tentado por Satanás, e os anjos o serviam (cfr Mc 1,12 -13). Mas tanto Mateus como Lucas desenvolvem a narração das tentações e da vitória. Jesus tinha passado quarenta dias em jejum, e estava sentindo fome. O demônio começou por aí: “Se és filho de Deus, manda que estas pedras se transformem em pães” (Mt 4, 3).

A resposta de Jesus foi imediata: “Está escrito: ‘Não só de pão vive o homem, mas de toda a palavra que sai da boca de Deus’” (v 4). O tentador o levou, então, à Cidade Santa e o colocou no pináculo do Templo. E o desafiou: “Se és Filho de Deus, atira-te daqui para baixo, pois está escrito: ‘Ele dará ordem a seus anjos a teu respeito, e eles te tomarão pelas mãos, para não tropeçares em alguma pedra”’.

E Jesus respondeu prontamente: “Também está escrito: ‘Não tentarás o Senhor  teu Deus’ (ibid., vv 6 e 7). É interessante notar que uma desta tentação vai reaparecer no Calvário: “Se és Filho de Deus, desce da cruz” (Mt 27, 40). E veio, então, a terceira tenta­ção. Por não sabermos qual sorte de fantasmagoria, o demônio transportou Jesus a um monte altíssimo, e ali daquelas alturas lhe mostrou o deslumbrante espetáculo da grandeza de todos os reinos do mundo. E lançou seu insolente desafio: “Eu te darei tudo isto, se prostrado me adorares”. E Jesus respondeu com nobre majesta­de: “Vai-te, Satanás, porque está escrito: ‘Ao Senhor teu Deus adorarás e só a Ele prestarás culto” (vv. 8-10). Aí, o demônio o deixou em paz e vieram os anjos do céu para servi-Io.

E fácil descobrir como essas tentações correspondem às três áreas de inclinação para o mal a que está sujeito o homem nesta terra: a área dos prazeres dos sentidos, a área da soberba e da vai­dade, e a área da cobiça dos bens e do dinheiro. Os três ídolos aos quais o homem de hoje presta sua adoração: o prazer, o poder, o dinheiro. E Jesus nos ensina o caminho para vencer essas más inclinações. E procurar a força de Deus, a força de sua palavra, que ilumina os caminhos e nos dá coragem para caminhá-Ios.

A Quaresma está aí para nos ajudar nesse trabalho. Para nos levar à conversão, na medida em que dela precisamos. E justamen­te nos traz neste primeiro domingo o exemplo de Jesus. Convida­mos a usar o remédio que Ele usou: a Palavra de Deus, a oração, o jejum.

Quaresma é tempo da Palavra de Deus. Como não lembrar as famosas pregações quaresmais de outros tempos? Os pastores de hoje, em estilo mais modesto, sabem descobrir novos caminhos para a catequese e a evangelização. A Campanha da Fraternidade cumpre em grande parte esse papel. Quaresma é tempo de oração.

 

Rezar mais e, sobretudo, rezar melhor. E incrível a desproporção entre os poucos minutos diários que os cristãos, na média, dedicam à oração, e as muitas horas gastas nas outras ocupações! Quaresma é tempo de jejum e penitência. A Igreja abrandou muito a antiga disciplina do jejum, que era observado outrora realmente durante quarenta dias. Em parte ela o fez, olhando para os milhões de cristãos de hoje, que fazem um jejum forçado, pelas condições de pobreza em que se encontram. Mas não estamos dispensados do jejum. Ou melhor, não estamos dispensados de praticar a sobriedade cristã, que nos faz moderar o uso da comida e da bebida e fugir de todos os excessos, por exemplo, no hábito de fumar.

Vamos desejar e esperar que a Quaresma nos leve a um conhecimento sempre maior de Jesus Cristo – é o que pede a “coleta” da missa deste domingo – de quem vamos celebrar no fim destes quarenta dias a Sagrada Paixão, a Morte e a Ressurrei­ção.

 

LEITURAS do 19 domingo da Quaresma – Ano B:

1º – Gn 9. 8-15.

2º -1 Pd 3.18-22.

3º – Mc 1, 12-15.

Mt 4,1-11- I Domingo da QUARESMA – NO MONTE DA TENTAÇÃO

Reflexões e ilustrações de Padre Lucas de Paula Almeida, CM

 I Domingo da Quaresma

No primeiro domingo da Quaresma, aparece na Liturgia o tema da tentação.

E logo na primeira leitura da missa, somos reconduzidos à aurora da humanidade, onde aconteceu- segundo a narração do terceiro capítulo do Gênesis- a tentação e a queda do homem, que deu origem ao pecado e a todo o mal de que está entretecida a história da humanidade. A narração de como o demônio tentou nossos primeiros pais é um primor de sabedoria psicológica. O tentador começa procurando despertar em Eva a má vontade para com o Criador, exagerando a ordem de Deus, para apresentá-lo como demasiado exigente e autoritário:

“E verdade que Deus vos proibiu comer de qualquer árvore do jardim?”  Eva – já começando a ficar abalada em sua confiança em Deus – ainda procurou  defendê-lo: “Não é bem assim.

Podemos comer de todos os frutos das árvores do jardim. Só não podemos comer do fruto da árvore que está bem no centro. Se dela comermos, morreremos”. Ela fizera mal em não cortar o diálogo antes que começasse. Veio daí toda a catástrofe. O tentador lhe fez ver que o fruto era belo e apetitoso.

E ela comeu e deu-o ao marido. E desmoronou toda a felicidade de que se gozava na paz da inocência daquele alvorecer do mundo (Cfr Gn 3,1-7). Veio o remorso, a antevisão da morte, a vida marcada pela dor e pelo sofrimento, embora já se prenunciando para um dia a vitória, do Salvador, que iria esmagar a cabeça da serpente infernal. E o proto-evangelho.

Jesus quis ser tentado. Não que pudesse cair na tentação, mas para nos ensinar como devemos vencê-Ia: pela força da Palavra de Deus. À tentação da comida, quando o demônio lhe insinuava que transformasse as pedras em pães, Ele respondeu: “Não só de pão vive o homem, mas de toda a palavra que sai da boca de Deus”. Que era como está escrito no Deuteronômio (Dt 8,3). Quando o demônio o tentou pela vaidade e a exibição, convidando-o a atirar-se do pináculo do Templo, pois Deus mandaria seus anjos para ampará-Io, a fim de que nada de mal lhe acontecesse, Ele responde com uma palavra ainda do Deuteronômio: “Não tentarás ao Senhor teu Deus” (Ibid. 6, 16). E, quando finalmente lhe oferece todos os reinos da terra em troca de um ato de adoração – a tentação da ambição, ainda hoje tão presente no mundo, transformando tantos homens em adoradores do demônio – é ainda no mesmo livro da Escritura que Jesus vai buscar sua resposta: “Ao Senhor teu Deus adorarás, e só a Ele servirás” (Ibid. 6, 13). E é uma beleza o final do episódio, quando o demônio, vencido, se retira, e os anjos de Deus vêm servir a Jesus.

Nós também teremos as forças do céu a nosso serviço, se soubermos, na escola de Jesus, vencer as tentações. Elas estão aí presentes em toda parte e a cada momento de nossa vida. Como lá no deserto, onde Jesus passou seus quarenta dias de jejum e oração, temos que saber santificar nossa vida pela oração e pela mortificação, para que nunca nos falte a força de Deus.

É muito nítida, na seqüência das tentações a que o demônio submeteu Jesus, a semelhança com as tentações a que somos submetidos na terra. Somos também nós submetidos à tentação dos prazeres materiais, à tentação da ambição, e à tentação do orgulho. Já foi observado por mais de um escritor de coisas do espírito que seria impossível encontrar um resumo mais inteligente das tentações que tentam o homem, do que essas tentações que Jesus enfrentou no deserto. São, afinal, aquelas três paixões desregradas que São João enumera em sua primeira carta: concupiscência da carne, concupiscência dos olhos, e soberba da vida; ou, em outras palavras, sensualidade, orgulho, sede do dinheiro (1 Jo, 2,16).

Devemos estar preparados para resistir aos ataques do adversário- e a Quaresma está aí para nos lembrar isso- através da oração, do jejum e da penitência em geral, da força da Palavra de Deus. Nessas forças do céu, de que nos devemos valer sempre, teremos a energia necessária para a luta. Vale bem aqui a famosa palavra do grande Doutor da Igreja, Santo Afonso de Ligório: “Quem reza, se salva; quem não reza, se condena”. Além do mais, sabendo que Deus é fiel, e não permite que sejamos tentados acima de nossas forças. Pelo contrário, faz surgir da própria tentação algum bom resultado ( cfr 1 Cr 10,13).

Leituras do I Domingo da Quaresma -Ano A:

1a) Gên 2,7-9.3,1-7

2a) Rom 5,12-19 – Rom 5, 12-17.19

3a) Mt 4,1-11

Reflexões e ilustrações de Padre Lucas de Paula Almeida, CM

 I Domingo da Quaresma

O amanhecer do Evangelho

AS TENTAÇÕES A JESUS NO DESERTO –

VÍDEO E ROTEIRO DA HOMILIA DO I DOMINGO DA QUARESMA – Padre Lucas
I Domingo da Quaresma -ANO C – AS TENTAÇÕES A JESUS NO DESERTO

Estamos entrando na Quaresma, esses quarenta dias de oração e penitência com que a Igreja nos prepara para a solene celebração da Páscoa. Quarenta era um número particularmente significativo no mundo bíblico. O dilúvio durou quarenta dias e quarenta noites. O povo hebreu viveu quarenta anos de vida nômade no deserto. Moisés passou quarenta dias junto de Deus no Sinai. Mas, sobretudo, Jesus passou quarenta dias de jejum no deserto, o que inspirou o estabelecer-se na Igreja destes quarenta dias de penitência da Quaresma. O deserto de que se fala aqui não é um deserto de areia, como o Saara. É uma região pedregosa, árida e inculta, onde apenas na primavera uma escassa vegetação dá uns sinais de vida. Trata-se do deserto de Judá e, segundo a tradição, da elevação chamada Djebel-Qarantal, não longe de Jericó. Aí se estabeleceram monges desde o século IV. Hoje está em mãos dos cristãos ortodoxos.

É sempre muito misterioso pensarem Jesus submetido às tentações do demônio. Ele o Santo, Ele o impecável, Ele que jamais poderia sucumbir à tentação! A carta aos hebreus diz que “tendo Ele mesmo sofrido pela tentação, é capaz de socorrer os que são tentados” (Hb 2, 18). Uma vez que Ele se fez em tudo igual a nós, exceto no pecado. Há proveitosas reflexões de comentadores do Evangelho e de mestres espirituais, que nos mostram como Jesus passou pelas várias espécies de tentação por que nós passamos, resumidas na gula, na soberba e na avareza. E nos mostrou como é na força da Palavra de Deus que encontramos o meio de resistir às tentações. O nosso Padre Vieira disse elegantemente: “Permitiu pois Cristo Senhor Nosso ser tentado do demônio hoje, não para se honrar com a vitória ( que era pequeno triunfo) mas para nos ensinar a vencer com seu exemplo” (Sermão do I Domingo da Quaresma).

Mas, segundo as mais ponderadas considerações dos estudiosos, as tentações visavam o messianismo de Jesus. O demônio queria tirar a dúvida se Ele era realmente o Messias. E queria desencaminhá-lo da idéia de um Messias sofredor, destinado à morte, como está nas profecias de Isaías, e levá-lo para a idéia de um Messias político e triunfador. São três desafios -“se és o Filho de Deus” – iguais ao que vai aparecer no dia da crucifixão: “Se és o Filho de Deus, desce da cruz” (Mt 27, 40). E, como só podia ser, Jesus resistiu a tudo com divina sabedoria.

Primeiro, foi a tentação de satisfazer a fome. Jesus tinha jejuado quarenta dias e quarenta noites (não como os muçulmanos no mês de Ramadan, que jejuam de dia, mas comem durante a noite). Teve fome. Na frente estavam as pedras daquele lugar selvagem. O demônio se aproximou e lançou a tentadora insinuação: “Se és o Filho de Deus, manda que estas pedras se transformem em pães”.
E Jesus, prontamente, respondeu: “Está escrito: não só de pão vive o homem, mas de toda palavra que sai da boca de Deus” (Mt 4, 4). O demônio, então, o arrebata até Jerusalém e o coloca sobre o pináculo do Templo. E lhe diz: “Se és Filho de Deus, atira-te daqui abaixo, porque está escrito: ‘Dará ordem aos seus anjos a teu respeito, a fim de que te guardem’. E também: ‘Hão de te levar em suas mãos, para que não tropeces em alguma pedra’ ” (Lc 4, 3-4). E a resposta de Jesus foi mais do que pronta: “Foi dito: ‘Não tentarás ao Senhor teu Deus’ ” (Ibid. , v 12). Deus pode fazer milagres, e os faz, porém nunca para satisfazer à vaidade de alguém. Ele os faz, quando assim o determina sua santíssima vontade. E veio a terceira tentação ( em Lucas está em segundo lugar).

Por não se sabe qual prodígio de fantasmagoria, o demônio levou Cristo ao cimo de um altíssimo monte, donde se viam todos os reinos do mundo, com todo o seu esplendor. E lhe disse: “Tudo isso te darei, se prostrado me adorares”. Foi quando Jesus respondeu com vibrante energia: “Vai-te, Satanás, porque está escrito: ‘Ao Senhor teu Deus adorarás e só a Ele prestarás culto’ ” (Mt 4, 8-10). Três ataques! Três vitórias! Tudo pela força da Palavra de Deus!
O demônio então se retirou. E os anjos do céu se aproximaram de Jesus para servi-lo (Mt 4, 11).
LEITURAS do I Domingo da Quaresma – Ano C:
1a) Dt 26, 4-10
2a) Rm 10, 8-13
3a) Lc 4, 1-13