Mt 16,21-27 –  A PRESENÇA DA CRUZ – Pe. LUCAS

O AMANHECER DO EVANGELHO

REFLEXÕES E ILUSTRAÇÕES DE PE. LUCAS DE PAULA ALMEIDA, CM

A PRESENÇA DA CRUZ

HOMILIA PARA O XXII DOMINGO DO TEMPO COMUM

A palavra de São Pedro, proclamando que Jesus era o Messias -“Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo” – ficou pairando no ambiente dos apóstolos como uma estrela fulgurante de esperança. Sobretudo por ter sido ela confirmada por Jesus, com a declaração de que era uma palavra inspirada pelo Pai que está no Céu. Mas, precisamente para que esse entusiasmo não fosse desviado para caminhos de uma falsa interpretação, Jesus, com a sabedoria pedagógica que lhe era própria, achou necessário fazer um esclarecimento. Ele era, sim, o Messias. Não, porém, o Messias político e triunfador que estava no pensamento da maioria dos judeus. Seu messianismo era o que tinha sido anunciado pelos profetas: incluía a dor, o sofrimento, a morte. O Rei-Messias era ao mesmo tempo o Servo de Javé, o sofredor, das profecias de Isaías.

Jesus o prediz com todos os pormenores: “Era necessário que Ele fosse a Jerusalém – pois nenhum profeta morria fora de Jerusalém, como o próprio Jesus tinha certo dia mandado dizer a Herodes Ântipas (Lc 13,33) – para sofrer muito da parte dos anciãos, dos príncipes dos sacerdotes, e dos escribas; que fosse condenado à morte e que ressuscitasse ao terceiro dia” (Mt 16,21 ). Era a predição da longa caminhada do sofrimento, desde o Getsêmani, até o Sinédrio e os tribunais de Herodes e de Pilatos, a clamorosa injustiça da sentença de morte, a flagelação, a cruz, o Calvário, a morte. Para Jesus tudo isso estava presente muito claro no seu espírito. E Ele quis dizê-Io de maneira muito explícita, para que não ficasse nenhuma dúvida.

Mas também ficou bem claro que ao terceiro dia ressuscitaria. Tem-se nítida a impressão de que os apóstolos não prestaram atenção nessa palavra final, que iluminava de glória todo o caminho anterior do sofrimento. Isso aparece com toda a evidência em São Pedro, que reclamou veementemente contra a idéia de que Jesus ia sofrer e morrer.

Ele que, inspirado pelo Pai do céu, tinha proclamado com tanto entusiasmo que Jesus era o Messias, agora passa para o extremo oposto e é movido por um espírito de quem “não entende das coisas de Deus”. “Deus te livre disso! – foi como ele disse, tomando Jesus à parte – Que isso não te aconteça!(Ibid.,22).

No fundo, como nota São Jerônimo, ele estava sendo movido pelo seu desmesurado amor a Jesus. De certo modo, o amor tentava suplantar a razão. Por isso mesmo, a reação de Jesus foi sumamente enérgica, para cortar o mal pela raiz: “Retira-te de mim, Satanás, tu és para mim uma pedra de tropeço, pois teus pensamentos não são de Deus, mas dos homens” (v 23 ). São Pedro estava agindo com um espírito igual ao do Tentador {“satanás” quer dizer “adversário”, “tentador”) que, no deserto um dia tinha procurado desviar Jesus de seu caminho.

Tendo como pano de fundo a “via-sacra” que fizera antever, Jesus continuou: “Se alguém quer vir em meu seguimento, renegue-se a si mesmo, tome a sua cruz e siga-me”. E disse mais ainda: “Quem quiser salvar sua vida, perdê-Ia-á; mas quem perder a vida por amor de mim, encontrá-la-á de novo” {v v 24-25). São Lucas refere a palavra de Jesus em termos ainda mais rígidos: “Quem não toma sua cruz e não me acompanha, não pode ser meu discípulo” {Lc 14,27). Não é cristão quem não tiver espírito de abnegação e renúncia.

E, para encorajar-nos, aí está Jesus à nossa frente, levando nos ombros a cruz. Até para o equilíbrio da vida na sociedade, nesta etapa temporal que estamos vivendo, a capacidade de renúncia é necessária. A corrida ao prazer e ao comodismo é o que vai desgastando os valores da sociedade. A capacidade de enfrentar os sofrimentos na paciência e na perseverança é o que faz a grandeza das mães, dos mestres, dos pastores e de todos quantos têm alguma responsabilidade de presença construtiva na sociedade. Sem uma grande dose de renúncia, nada de bom se procurará construir. No fogo é que se purifica o ouro. Quem não quiser sofrer, recusa- se a ser um dia coroado. Pois “o Filho do homem virá um dia na glória de seu Pai, com seus anjos, e retribuirá a cada um segundo as suas obras” (Mt 16,26).

 

Leituras do XXII Domingo do Tempo Comum – Ano A:

1a) Jer 20,7-9

2a) Rom 12,1-2

3a) Mt 16,21-27