Lucas 12, 35-38 – Por meio da parábola o evangelho de hoje traz uma exortação à vigilância –
A Vida não nos é tirada, mas sim transformada- dia de Fi
Na natureza tudo nasce, cresce, espalha sementes e morre, para depois recomeçar o ciclo da vida.
Folhas secas caem pelo chão, para dar lugar à nova folhagem que surge com a primavera. Velhas árvores secam-se e caem, depois de terem espalhado muitas sementes pelo vento. O rio chega ao mar, muitas vezes, todo contaminado pela nossa poluição, mas lá nos grotões das serras as águas cristalinas continuam a borbulhar nas nascentes alimentam.
Talvez alguns desejariam nunca morrer e nem ver morrer aqueles a quem amam tanto… como seria um mundo sem morte, onde todos vivessem para sempre? Nossa fé na ressurreição nos faz acolher este sentido da morte: uma etapa se fecha e uma nova se abre no grande processo da vida. Com a fé, nosso desejo de viver eternamente se torna certeza de que “a vida não nos é tirada, mas transformada”.
Contemplando a natureza podemos captar o sentido profundo – e por isso bonito – da morte, que marca nossas vidas. Como são Francisco de Assis, podemos, então, até louvar o Senhor pela “irmã morte”, que nos vem tomar pela mão no momento da “grande passagem”.
É claro que a morte tem, muitas vezes, uma face assustadora, aterrorizante e dolorosa. A morte de quem viveu longos anos, viu sua família crescer e se multiplicar e pôde experimentar muitas coisas que dão gosto à existência não nos causa tanto impacto.
Também é mais fácil aceitar a morte daqueles que estavam sofrendo demais por causa de uma doença. Mas o que dizer daquela morte prematura, repentina, de pessoas que ainda tinham todo o futuro pela frente? O que dizer das vítimas da violência da guerra, do trânsito, da miséria? São como árvores que antes de darem fruto já foram cortadas e suas raízes arrancadas…
Nossa fé no faz afirmar que, como na natureza tudo o que cai na terra acaba se transformando em húmus que fertiliza o chão e possibilita a continuidade do ciclo da vida, assim essas vidas que para nós foram “aceifadas antes da hora” são acolhidas no chão de Deus e Ele quem as transforma, dando continuidade ao grande processo da vida.
Assim, amados irmãos irmãs, quero renovar em seus corações esta esperança, para que a recordação da realidade da morte nesse dia não os entristeça a ponto de obscurecer esta outra realidade tão importante: “é morrendo que se vive para a vida eterna”.
Que o Senhor acolha a todos os falecidos no “chão” do seu Reino de vida em abundância.
O VAZIO QUE DEIXAM SE PREENCHE COM A FÉ
O VAZIO QUE DEIXAM SE PREENCHE COM A FÉ
Nesses dias, celebramos Todos os Santos e Todos os fiéis defuntos, que são duas notas de um mesmo acorde: uma chamada à eternidade. Para os primeiros, que já participam plenamente da Páscoa do Senhor, e, para os segundos, que ainda guardamos em nossa memória ou ninguém mais lembra deles, a Igreja reza e lhes oferece esse dia de meditação, de oração, eucaristia e reflexão.
Todos os mortos devem nos comover profundamente. Sua ausência continua sendo para nós um enigma. Umas vezes é lei de vida e outras algo inesperado. Mas, além de tudo isso, é bom pensar que, os que nos têm precedido, levaram todo o poder do amor de Deus, que um dia os ressuscitará do silêncio da morte, que agora os domina.
A vida é como uma partida de futebol. Tem dois tempos bem distintos. No primeiro deles, o homem se sente protagonista total. Parece que tudo é definitivo. Como se os nossos dias não tivessem fim. Como se o homem fosse dono absoluto de tudo e em tudo.
Amamos, odiamos, crescemos, trabalhamos, sofremos, formamos uma família, nos realizamos, viajamos. É o tempo de decolar. De aproveitar o máximo no campo de jogo.
No segundo tempo de nossa existência, descobrimos que a morte nos dá um passe errado.
Ilusões e projetos, altos e baixos, economias e ideais acabam e são de repente julgados injustamente por esse grande juiz vestido de preto que é a morte. Então, também, bebemos o cálice amargo de nossa fraqueza. Nem a ciência pode ser resposta definitiva para tudo, nem dominamos os destinos de nossos dias como pensávamos.
É, neste último tempo, que assistimos da arquibancada de nossa felicidade a despedida de nossos entes queridos. É, nesse momento, que aprendemos também por conta própria a julgar com a arte e a fé, a esperança e a caridade, os valores e a ética, que nossos entes queridos nos deixaram.
Entre eles, o mais importante, o próprio Deus.
Deus, mesmo quando tudo parece perdido, nos diz que a partida não acabou. Que há uma prorrogação na eternidade. Que a morte não decidiu contra nós o Jogo com a vida. Que existe um terceiro tempo ao qual todos nós podemos chegar, se não perdemos pelo caminho a confiança, a fé e o imenso amor de Deus que Jesus trouxe até nós.
Nesse terceiro tempo é onde, hoje, situamos os nossos mortos. Onde os deixamos e onde sonhamos revê-los. Onde viveremos um dia em companhia daqueles que tanto significaram para nós e que a morte, injusta ou justamente, os tem arrebatado de nós.
Não é consolador viver esse dia com essa perspectiva? Mais importante que o Juiz da morte, é o Dono do campo de jogo e da própria vida: nosso DEUS.
Enquanto isso, olharemos para cima e para baixo, à nossa esquerda e à nossa direita, e
continuaremos desfrutando de tantos bens materiais e espirituais que eles nos deixaram. Continuaremos jogando limpo com classe e honradez, como tantas vezes nos pediram. Avançaremos, como crentes, procurando vencer de goleada com o espírito que nos marcam as bem-aventuranças. Pensaremos que a nossa própria existência é uma brisa que passa e que, portanto, precisa saber respirá-la profundamente para nos oxigenar com a graça divina.
Hoje, na festa de todos os mortos, constatamos que muitos lugares vazios, um dia estiveram ocupados por aqueles entes queridos. Embora estando fisicamente ausentes, os sentimos hoje ainda bem vivos em nosso coração.
O eco de suas palavras continua pairando no ar de nossas casas. O trabalho e a vitalidade com que viveram, nos ajudam a manter vivo o seu espírito.
A fé, com que fecharam seus olhos, é luz para quando nos custa ver a Deus.
E o vazio, que a sua partida nos deixou, o encheremos com a fecundidade da Palavra de Deus, com a esperança que nos oferece Jesus Cristo que, por sermos filhos de Deus, não permitirá que permaneçamos para sempre no esquecimento.
Lucas 12,35-40 – Por meio da parábola o evangelho de hoje traz uma exortação à vigilância.
A Bíblia Explicada em Capítulos e Versículos
O Amanhecer do Evangelho
Reflexões e ilustrações de Pe. Lucas de Paula Almeida, CM
SEGUNDA-FEIRA DA 31ª SEMANA DO TEMPO COMUM
1) Oração
Deus eterno e todo-poderoso, dai-nos a graça de estar sempre ao vosso dispor, e vos servir de todo o coração. Por nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho, na unidade do Espírito Santo.2) Leitura do Evangelho (Lucas 12, 35-38)
35Estejam cingidos os vossos rins e acesas as vossas lâmpadas. 36Sede semelhantes a homens que esperam o seu senhor, ao voltar de uma festa, para que, quando vier e bater à porta, logo lha abram. 37Bem-aventurados os servos a quem o senhor achar vigiando, quando vier! Em verdade vos digo: cingir-se-á, fá-los-á sentar à mesa e servi-los-á. 38Se vier na segunda ou se vier na terceira vigília e os achar vigilantes, felizes daqueles servos!3) Reflexão
* Por meio da parábola o evangelho de hoje traz uma exortação à vigilância.* Lucas 12,35: Exortação à vigilância
“Estejam com os rins cingidos e com as lâmpadas acesas”. Cingir-se significava amarrar um pano ou uma corda ao redor da veste talar, para que ela não atrapalhasse os movimentos do corpo. Estar cingido significava estar preparado, pronto para ação imediata.Na véspera da saída do Egito, na hora de celebrar a páscoa, os israelitas deviam estar cingidos, isto é, preparados, prontos para poder partir imediatamente (Ex 12,11).Quando alguém ia trabalhar, lutar ou executar uma tarefa ele se cingia (Ct 3,8). Na carta aos Efésios, Paulo descreve a armadura de Deus e diz que os rins devem estar cingidos com o cíngulo da verdade (Ef 6,14). As lâmpadas deviam estar acesas, pois a vigilância é tarefa tanto para o dia como para a noite. Sem luz não se anda na escuridão da noite.* Lucas 12,36: A parábola
Para explicar o que significa de estar cingido, Jesus conta uma pequena parábola. “Sejam como homens que estão esperando o seu senhor voltar da festa de casamento: tão logo ele chega e bate, eles imediatamente vão abrir a porta”.A tarefa de aguardar a chegada do patrão exige uma vigilância constante e permanente, sobretudo quando é de noite, pois, o patrão não tem hora marcada. Ele pode voltar a qualquer momento. O empregado deve estar atento, vigilante sempre!* Lucas 12,37: Promessa de felicidade
“Felizes dos empregados que o senhor encontra acordados quando chega. Eu garanto a vocês: ele mesmo se cingirá, os fará sentar à mesa, e, passando, os servirá”.Aqui, nesta promessa de felicidade, os papeis se invertem. O patrão se torna empregado e começa a servir ao empregado que virou patrão. Evoca Jesus na última ceia que, mesmo sendo senhor e mestre, se fez servidor e empregado de todos (Jo 13,4-17).
A felicidade prometida tem a ver com o futuro, com a felicidade no fim dos tempos, e é o oposto daquilo que Jesus prometeu numa outra parábola que dizia:“Se alguém de vocês tem um empregado que trabalha a terra ou cuida dos animais, por acaso vai dizer-lhe, quando ele volta do campo: Venha depressa para a mesa? Pelo contrário, não vai dizer ao empregado: ‘Prepare-me o jantar, cinja-se e sirva-me, enquanto eu como e bebo; depois disso você vai comer e beber’? Será que vai agradecer ao empregado, porque este fez o que lhe havia mandado? Assim também vocês: quando tiverem cumprido tudo o que lhes mandarem fazer, digam: Somos empregados inúteis; fizemos o que devíamos fazer” (Lc 17,7-10).* Lucas 12,38: Repete a promessa de felicidade
“E caso ele chegue à meia-noite ou às três da madrugada, felizes serão se assim os encontra!” Repete a promessa de felicidade que exige vigilância total. O patrão pode voltar meia noite, três da madrugada, ou qualquer outra hora. O empregado deve estar acordado, cingido, pronto para poder entrar em ação.4) Para um confronto pessoal
1) Somos empregados de Deus. Devemos estar cingidos, de prontidão, atentos e vigilantes, vinte e quatro horas por dia. Você está conseguindo? Como faz?
2) A promessa de felicidade futura é a inversão do presente. O que isto nos revela sobre a bondade de Deus para conosco, para comigo?5) Oração final
Escutarei o que diz o Senhor Deus, porque ele diz palavras de paz ao seu povo,para seus fiéis, e àqueles cujos corações se voltam para ele. Sim, sua salvação está bem perto dos que o temem, de sorte que sua glória retornará à nossa terra. (Sl 84, 9-10)
Reflexão do Evangelho: Sobre a Vigilância (Lucas 12,35-40)
Vigiar é uma atividade de cuidado e atenção. Infelizmente vigiar, em nosso vocabulário comum, tornou-se uma palavra com conotação negativa muito forte. Pensando na religião, essa palavra se conectou de tal forma a uma imagem de um Deus que pune, ao ponto de se transformar, para muita gente, num lugar de medo, opressão, culpa e castigo. Nada mais contrário ao seu significado etimológico e à experiência cristã e de outros grupos de Deus.
Religião é para juntar as pessoas e a natureza. É conexão, relação amorosa e de equidade. É espaço de cura, sanação e transformação constante. A “verdadeira” religião, segundo o movimento profético, é “buscar a paz e a justiça”, “defender o órfão e a viúva” (cf. Tiago 1,27). Não deve ser lugar onde o medo e o castigo, a guerra, violência e intolerância sejam o prato do dia.
Essa prática, resultante de um tipo de teologia, foi amplamente desautorizada por Jesus. Mesmo seus discípulos estavam envoltos nesse universo teológico e de espiritualidade violento e intolerante. Precisavam experimentar outra leitura possível da religião na qual estavam inseridos. E não só os discípulos no tempo de Jesus, mas também a Igreja de Lucas na segunda metade do século.
Religião como espaço de liberdade e libertação
Em seu evangelho, entre os capítulos 9 a 19, Lucas apresenta um Jesus que provoca caminhos novos nos quais se possa entender a experiência de Deus e viver a religião como espaço de liberdade e libertação. As conversas e reflexões deste bloco do evangelho estão direcionadas principalmente para as pessoas que seguiam a Jesus mais de perto (chamados de discípulos ou de os Doze em outro evangelho).
Depois de uma longa conversa sobre o desapego, provavelmente visando colaborar com a comunidade para que compartilhe seus recursos humanos e econômicos, Jesus pede que os discípulos tenham os “rins cingidos e as lâmpadas acesas”. Eles devem estar sempre preparados para serem “excêntricos”: preparados para sair de si mesmos, desapegar-se de seu lugar comum e mover-se em direção ao outro e ao mundo, que clama e geme dores de parto (Romanos 8,22).
Cingir os rins: discernir pela vida em plenitude
Há uma tradição bíblica que identifica os rins como o lugar dos sentimentos, o lugar do afeto, por onde somos “afetados” pelo mundo externo e pela experiência íntima de Deus. É o lugar da nossa consciência ética e estética. É o lugar das nossas decisões. Temos que decidir por onde ir, que teologia desenvolver, a quem escutar. É preciso saber “quem é o meu próximo”, que conflitos assumir e decidir viver para Deus, não para nossas verdades e posses. Cingir os rins é pedido para estar preparadas/os, para movimentar nosso corpo em defesa dos valores do Reino. É requisito e expressão da fé: movimento pela vida e plenitude.
Ficar com a lâmpada acesa: iluminar a escuridão do mundo Jesus também nos pede para ficar com a lâmpada acesa. Somos chamadas/os para estar como luz, como indicador de caminho, como facilitador de processos e como iluminador da escuridão diante e dentro do mundo. O encontro com Jesus e a convivência com ele deve nos encher de energia (dínamo, no grego, significa força, poder). Com Jesus, temos condições de atuar no cotidiano não nos deixando “conformar” pelos poderes opressores e hegemônicos deste mundo em que vivemos. Transformados, vivemos pela fé para outro mundo possível e podemos desenvolver outras teologias possíveis em favor da vida e da libertação.
A lâmpada acesa não deve ser usada para cegar e impedir que novidades sejam descobertas. Os rins cingidos são para redescobrir nossa vocação para a indignação e para a missão: ocupar as ruas e as ideo-teologias para que a vontade de Deus seja feita assim na terra como no céu; para que a justiça e misericórdia sejam o prato do dia; para que o pão nosso cotidiano seja realidade.
Vocação não é talento, é chamado, convocação a escutar a vontade de Deus com os ouvidos do coração Para a Igreja Católica Romana, agosto é o mês dedicado às “vocações”. É bom lembrar que vocação não é habilidade, talento. Vocação é CHAMADO, CONVOCAÇÃO. Por isso cingir os rins e manter nossa luz acessa é tão importante. Para escutar com os ouvidos do coração (no nosso mais interior) a voz de Deus que clama no deserto, que grita através do povo e dos grupos violentados e excluídos do convívio e estrutura social e das igrejas e grupos religiosos.
O que estamos ouvindo? A quem estamos ouvindo? Que chamado (vocação) estamos atendendo? Estejam preparadas/os sempre. Porque o Filho do Homem (profeta, militante da vida e da inclusão) aparece de surpresa e surpreende como aparece. Estejamos preparadas/os. Esperemos contra toda esperança (Romanos 4,18) e oremos (ora et labora – orar e trabalhar) para que a vontade de Deus seja feita e sua palavra seja nossa palavra: ação criadora e plural neste mundo e no mundo que há de vir, agora e depois.